José González - um talento musical desconhecido
Tenho uma mania de tentar desvendar em cada artista novo que me chega as fontes donde irrompe sua arte. Sabemos todos que nada surge do nada, e por isso o exercício que faço não significa desnudar o artista ao me colocar como um déspota, afirmando que ele copiou essa ou aquela experiência estética. Pelo contrário. Essa minha prática nada mais é do que uma vontade irresistível de achar sentido em tudo. E até mais do que isso: associar esta nova arte que me chega ao rol de realizações com as quais já me sinto familiarizado e tentar que certas sensibilidades estéticas, dentro de mim, se procurem e se reconheçam.
José González é um jovem sueco de 29 anos, filho de pais argentinos, cantor/compositor. Com freqüência seu trabalho é classificado como folk-pop, mas sua cosmogonia e seu universo artístico possuem outras nuanças que não permitem precipitadamente associá-lo apenas a esse estilo ou a nomes como Nick Drake. Cito Drake porque não é raro este nome aparecer como principal influência nas resenhas e artigos sobre o jovem González, em especial sobre seu último disco (In Our Nature, 2007).
Identificaria entre as primordiais influências de González o colorido-acústico do cubano Silvio Rodriguez (de quem ele declaradamente é fã), por onde se vê a predileção por dedilhados percussivos e insinuantes — característica que o distancia da bonita frigidez inglesa de Nick Drake. A plasticidade das peças para violão de Villa-Lobos – e demais compositores clássicos que se dedicaram ao violão - tem lugar na híbrida musicalidade de González, mesmo porque este fez seminário de música. Há também o violão popular brasileiro, tão influente e elogiado no mundo. João Gilberto, claro, a referência maior.
Deste último, aliás, faz eco certo intimismo nas canções de González, que muitos associam a uma incontornável timidez do jovem compositor. Acho, porém, mais adequado nos atermos a proposições estéticas, e compreendê-lo pelo conceito minimalista. Que não sublima, paradoxalmente, certos traços roqueiros, embora secundários, mas é facilmente identificável por determinado sotaque no canto e por uma sonoridade áspera e concentrada no violão.
Em In Our Nature, de 2007, González abandona a temática amorosa preponderante do primeiro registro (Veener, 2005) para escrever, ainda preso a um desconforto lexical com o idioma inglês (lembremos, ele é sueco), sobre questões voltadas ao “primitivismo da natureza humana”, seja lá o que isso queira dizer. O livro Deus, uma ilusão (2006), do biólogo inglês Richard Dawkins, é constantemente citado por González como maior influência para as suas novas canções. Para quem não ouviu falar do livro, trata-se de uma obra feroz sobre a desnecessária existência de Deus (na realidade, da religião) e de como ele (ou ela) é um entrave para a humanidade chegar à clareza da verdade sobre sua condição. Tem-se escrito que desde Nietzsche ninguém acena tão vorazmente contra Deus.
A ironia é que In Our Nature carrega uma espiritualidade à luz dos olhos. Chega a ser intrigante como uma leitura científica provocou na musicalidade gonzaliana um deslocamento sutil para algo mais orientalizado, mais “mântrico”. A canção “Cycling Trivialities”, que fecha o álbum, é um ótimo exemplo.
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