Gilberto Gil preferiu se omitir sobre a situação delicada do Brasil
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Gilberto Gil escreveu a branda e tranquila música "OK, OK, OK", que intencionalmente ou não acabou mascarando o tom grave e complexo do momento político brasileiro em que ela surgiu. Obviamente que se procurarmos sua clareza encontraremos beleza, mas percebemos que essa não é missão para qualquer um, quando deveria ser acessível a todos. Uma interessante suposição norte-americana sobre a expressao "OK" o define como forma de motivação em contexto de guerra, explicando que constava num tipo de placa posta no alto do alojamento a cada dia que se poderia informar que nao havia ocorrido nenhuma morte, e portanto 0K, que significava "0 killed"(zero mortos) e portanto, que estava tudo bem. Segue a letra de "OK, OK, OK" e algumas breves reflexoes:
"OK, OK, OK, OK, OK, OK
Já sei que querem a minha opinião
Um papo reto sobre o que eu pensei
Como interpreto a tal, a vil situação"
No segundo parágrafo poeta escapou alguns substantivos da ordem de seu sofrimento individual, em contraste ao coletivo. Esses versos nos fazem pensar o quanto se torna inútil discursar sobre pobreza, ódio, protestos e esperança enquanto nos roem ou tomam qualquer possibilidade de poder de transformação social, nos restando o choro e o lamento em coro. O coração de Gilberto é hipertenso e requer acompanhamento, talvez ele tenha lembrado disso ao citar o órgão.
"Penúria, fúria, clamor, desencanto
Substantivos duros de roer
Enquanto os ratos roem o poder
Os corações da multidão aos prantos"
Um artista famoso tem sua liberdade de expressão mais comprometida e limitada. Em trecho de desabafo Gilberto Gil demonstra que nao pode atender à diversidade de requisições que recebe, tao contraditórias. Para ele alguns o admiram, e por isso querem que ele clame, reclame e declame com fervor, tal como sua militância da juventude, enquanto outros o atentam sobre a importancia do silêncio, mas são apáticos à sua defesa, e tampouco o amam. Gilberto satiriza o modelo Tabajara de exigência da sociedade moderna, que busca solução milagrosa e imediata pra tudo apelando até a heróis e mitos. Além disso, Gilberto demonstra que ser solidário, amável e tratando todos como iguais seria a opção mais assertiva e nobre que ele esperaria ter em vida.
"Alguns sugerem que eu saia no grito
Outros que eu me quede quieto e mudo
E eis que alguém me pede “encarne o mito”
“Seja nosso herói”, “resolva tudo”
Dos tantos que me preferem calado
Poucos deles falam em meu favor
A maior parte adere ao coro irado
Dos que me ferem com ódio e terror
Já para os que me querem mais ativo
Mais solidário com o sofrer do pobre
Espero que minha alma seja nobre
O suficiente enquanto eu estiver vivo
(...)
Que o nobre, nobre mesmo, amava os seus
Prezava mais o zelo e a compaixão
Tratava seu vassalo com afeição
A mesma que pelo cão e o cavalo"
"ok, ok, ok" nao é so o nome de uma canção de Gilberto Gil, e sim a revelação de que ele foi convencido a emitir uma declaração sobre sua visao acerca da questão política brasileira, e que por ele julgar uma condição tão insignificante em relação aos seus objetivos e planos, preferiu sabiamente evitar adotar qualquer tipo de postura pessoal.
Então não falo, músico e poeta,
Me calo sobre as certezas e os fins
Meu papo reto sai sobre patins
A deslizar sobre os alvos e as metas
OK, OK, OK, OK, OK, OK
Sei que não dei nenhuma opinião
É que eu pensei, pensei, pensei, pensei
Palavras dizem sim, os fatos dizem não"
A ultima frase é a mais significativa e conclusiva desta obra de Gilberto Gil, pois apesar de suas palavras pretenderem ser positivas e expansivas, os fatos incentivam sua decisão contrária, a uma fala macia, passiva e por isso, sem nehuma opinião concreta.