*Socorro: não estou sentindo nada
Em determinado momento nos damos conta de que já não nos importamos mais. É um não-sentimento que aparece devagarzinho, com muita elegância e se instala como aquela visita que não vai mais embora.
Percebemos que receber mensagem ou não, falar ou não, encontrar ou não: tanto faz. Não é raiva. Não é decepção. E nem chega a ser desapego. Mas aquele anseio que arrebatava, fazia fritar depois de uma briga, aquela ausência que doía como um braço amputado agora cabe num prosaico “tanto faz”.
É o amor esvaziando.
É difícil aceitar que a “nossa” música vai tocar e não vai tocar. Que, antes de dormir, não se suspira de saudade, nem de agonia e muito menos de raiva. Simplesmente não se suspira.
Mas relutamos. Revisitamos fotos e relatos para nos reapropriarmos da emoção ali documentada. Em que gaveta ficaram os planos, em cuja linha final se lia “para sempre”?
Só resta um nada. Um nada que não machuca, mas não alimenta. Que é silêncio, mas não calmaria. Um nada que não promete, mas também não cumpre.
(*Socorro, letra de Arnaldo Antunes)