nem as mammas são eternas
De acordo com a mídia especializada, Nanni Moretti faz parte de uma tal "cúpula" do atual cinema europeu. Desde a Palma de Ouro conquistada por "La Stanza del Figlio" (O Quarto do Filho) em 2001, sua posição fora elevada a autêntico representante da nova safra cinematográfica italiana, o que despertou em mim (confesso) grande curiosidade. "Mia Madre" é a primeira realização sua que assisto.
Ao longo da estória fica nítido que o diretor vivenciou (ao menos) parte daquelas situações. Tanta força dramática geralmente remete à própria pele. Mais tarde li que durante as filmagens de "Habemus Papam" sua mãe de fato faleceu. Os livros que aqui aparecem em cena pertenceram a ela, bem como o figurino de Ada. Também dizem que Moretti é um profissional insistente, extremamente detalhista, daqueles que chegam a estafar a equipe de filmagem pelos repetidos retakes. Tudo fez sentido.
Em "Mia Madre", o próprio Nanni atua como Giovanni - outro filho da professora de latim - que abre mão do emprego para cuidar da mãe e age sempre com parcimônia perante o impactante abatimento da velhice. Ambos os personagens são afrontados com o definhamento da matriarca, porém como cada um absorve/lida com isso é completamente diferente e pessoal. Margherita se abate emocionalmente, deixa o furacão de sentimentos tomar conta de toda sua vida. Mal consegue trabalhar, grita, dorme pouco, não se concentra. Giovanni é mais seco, íntegro, digno, até mesmo corajoso; o que muitos considerariam como quase indiferente, mas é só seu jeito de encarar a dificuldade inevitável. Bem ou mal, é a maneira (geralmente) masculina de lidar com o fatídico. Segundo Moretti em entrevista à imprensa portuguesa, Giovanni é o irmão que Margherita gostaria de ser e a pessoa que ele mesmo gostaria de ter sido.
Outro ponto forte de "Mia Madre" são as doses homeopáticas de humor/neurose destiladas vez ou outra em seu desenrolar que mais parecem afagos após os constantes tapas na cara que a diretora Margherita leva da realidade. Ter que conduzir os mais diversos assuntos profissionais, a escolha de locações, acalmar os egos inflados dos atores e alinhar os trabalhos dos colegas paralelamente à dor de assistir impotente o definhamento da mãe é um desafio por vezes sobre-humano para ela - e para qualquer um.
Nós, os espectadores, conseguimos nos conectar fortemente aos personagens através de um dos mais poderosos liames emocionais existentes: o sofrimento. É exatamente ele que nos iguala no meio desse turbilhão louco de palavras não ditas, tímidas declarações e vontades não praticadas que transformaram a realidade daquela família em pura angústia. O trunfo do filme é retratar sem exageros melodramáticos como a inexorável passagem do tempo corrói não somente o físico, a matéria, mas destrói abruptamente e sem aviso nossos ídolos antes tão intocáveis no alto de seus pedestais.
Ninguém escapa: todos iguais no final.