Homem Aranha traz dilemas atuais sobre humanidade e as novas tecnologias
Homem Aranha – longe de casa, 2019 é o melhor filme da Marvel até o momento. Não sou leitora aficionada dos quadrinhos, mas assisto filmes de super-heróis com frequência e aprecio muito o gênero pelo humor característico, estórias e aventura. Porém, neste filme, o que vemos é muito mais que aventura, ação e uma dose de romance, típica dos filmes do Aranha. O filme tem uma trama imprevisível, misteriosa e até assustadora. O roteiro é extremamente complexo, intrigante e inteligente. E tudo isso é muito bem costurado, alinhado e construído pela direção impecável de Jon Watts.
Neste longa, há um grande espaço para o drama, os dilemas pessoais do herói em contraste com os dilemas sociais gerados pelas novas tecnologias, mote que percorre toda a trama, do início ao fim. Também há uma pitada bem dosada de romance, com cenas que mostram as nossas dificuldades nos relacionamentos, boas tiradas de humor e, claro, muita aventura e combate. O homem Aranha apanha muito, de todos os jeitos, no sentido físico e psicológico. E ele sente dor, aprende e amadurece.
O filme ainda tem imagens de combates sensacionais e vibrantes, tendo como cenário ao fundo a arquitetura antiga da Europa, nas cidades de Veneza, Praga e Londres. É uma aventura excitante que, ao mesmo tempo, nos faz pensar, nos envolvendo totalmente como uma experiência de cinema 180 graus.
O longa também explora aspectos muito interessantes como a diversidade cultural e as trocas de experiências. Os amigos do Peter Parker são a maioria estrangeiros, de diferentes culturas e, por isso, não há aquela típica padronização branca. A mocinha do filme também foge totalmente do padrão americano. Ela tem personalidade forte, uma estética própria e um comportamento rebelde. A MJ é uma garota afrodescendente interessante, diferente, verdadeira, doce e ácida, e muito bonita.
Este Aranha dialoga de uma forma divertida e inteligente com muitos temas da atualidade – as nossas dificuldades nos relacionamentos amorosos, a competitividade no mercado de trabalho - as disputas de ego e as intrigas, o uso excessivo de recursos tecnológicos - a sociedade da imagem, inteligência emocional X inteligência artificial, os vícios das redes sociais, ilusão X realidade, virtual e real, verdade X mentira, enfim, uma série de dualidades, contradições e contrastes que geram conflitos e que requerem um olhar mais demorado.
E o mais interessante de tudo isso, é que o filme mantém uma leveza e até um certo bom humor ao tratar de questões tão importantes e delicadas. O filme apresenta de um lado um super-herói humano em combate, apaixonado e dividido pelo prazer e a responsabilidade. Do outro lado, há um vilão vingativo, sem um real poder, apenas manipulador de tecnologias inteligentes que nos iludem. A história nos dá a dimensão de que esta guerra fictícia é tão real quanto uma criação. Os homens estão criando máquinas nocivas ou estão criando tecnologias para nos iludir e manipular? As máquinas nos manipulam ou nós as manipulamos? Quem manda?
O longa, não por acaso, começa falando de um poder extra do Homem Aranha, uma espécie de alerta, de sexto sentido, uma intuição que o leva a tomar as atitudes e decisões certas nos momentos certos. Este poder talvez seja o mais humano de todos. O Homem Aranha, ao longo da história, vai se revelando um super-herói corajoso e determinado, justamente porque errou em sua avaliação e confiou em quem não deveria. Ele se desdobra e se fortalece para corrigir seus erros, demonstrando confiança em si e nas suas convicções.
O Homem Aranha, no início do filme, é um garoto de 16 anos inseguro e quase sem tato para chegar na garota que gosta e revelar seus sentimentos. E ele se transforma em um verdadeiro super-herói ao final, com uma ajuda grande das máquinas e da tecnologia, é claro. Mas o mérito do herói é muito mais pelo seu lado humano, racional e intuitivo. Ele se torna alguém tão seguro, quanto forte e confiável. Ele se fortalece ao longo da jornada, tendo que enfrentar sozinho um pacote grande de ilusões, enganações e porradas, em uma sequência de imagens assustadoras e claustrofóbicas, reais e irreais. O pequeno grande herói se forja na luta, nos desafios e na experiência de ser humano e herói ao mesmo tempo, um fardo grande para um adolescente. E o ator se supera e faz um Homem Aranha encantador.
Vale a pena assistir! Você vai se surpreender e se enganar, se iludir, assim como o Homem Aranha e seus amigos. Mas se você prestar atenção na construção da trama como um todo, vai entender que este filme é especial e imperdível, realmente o melhor da Marvel.
Ficha Técnica: Título Spider-Man: Far From Home (Original), EUA Ano produção 2019 Dirigido por Jon Watts
Assista ao trailer do filme aqui