O TRABALHO E A “JUVENTUDES”: PROTEÇÃO OU (DES)PROTEÇÃO SOCIAL?
No Século XVIII as crianças eram vistas como “menores” que precisavam alguma proteção do Estado, com o objetivo de higienização e tinha um sistema disciplinador, visando alcançarem condições de ingressarem posteriormente no mercado de trabalho.
Somente em 1919, que a Organização Internacional do Trabalho/ OIT redigiu um documento que previa a “abolição do trabalho infantil” e em 1924, a Liga ou Sociedade das Nações, a antecessora da Organização das Nações Unidas /ONU publica a Declaração sobre os Direitos da Criança.
No Pós Segunda Guerra surge o Fundo de Emergência das Nações Unidas para as crianças/ UNICEF, com o intuito de auxiliar as crianças atingidas pela guerra e em 1953 foi transformado em uma agência permanente para assistência a infância.Assim foi surgindo diversos documentos, declarações, resoluções e tratados internacionais referentes a proteção da infância.
Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos marca a mudança de paradigmas na área da proteção à infância, trazendo o “direito a cuidados especiais para a maternidade e a infância”, tornando-se uma referência e fundamentação das declarações e tratados internacionais que lhe seguiram, como a Declaração dos Direitos da Criança em 1959 e a Convenção sobre os Direitos da Criança/CDC em 1989.A infância e adolescência passam a contar com a proteção integral e serem vistos como sujeitos de direitos, onde a família, a sociedade e o Estado devem prover pela sua proteção.
No decorrer dos 30 anos do ECA, a efetivação da proteção integral da criança e adolescente se fez com avanços e retrocessos, sendo que na atualidade temos vivenciados ameaças de retrocessos importantes, diante de uma pauta conservadora, como a Nota da Secretaria Nacional da Juventude apoiando a redução da maioridade penal e como as declarações do Presidente Bolsonaro defendendo o trabalho infantil.
Pode-se destacar como avanços as políticas sociais voltada para a juventude, acompanhando os acordos e tratados internacionais, tendo como destaque a Declaração sobre a Promoção entre a Juventude dos Ideais da Paz, Respeito Mútuo e Compreensão entre os Povos em 1965, que trazia 6 princípios para proteção dos mesmos, em consonância com a Declaração dos Direitos Humanos.
O Estatuto da Juventude/EJ estabelece como jovem a faixa etária de 15 a 29 anos e traz os princípios e diretrizes que visa a proteção da juventude. O EJ reconhece os direitos específicos dos jovens e a necessidade de políticas sociais que atuem de forma intersetorial, garantindo o atendimento integral da juventude. O Estatuto estabelece através de 11 Seções os direitos da juventude, sendo estes: Do Direito à Cidadania, à Participação Social e Política e à Representação Juvenil; Do Direito à Educação; Do Direito à Profissionalização, ao Trabalho e à Renda; Do Direito à Diversidade e à Igualdade; Do Direito à Saúde; Do Direito à Cultura; Do Direito à Comunicação e à Liberdade de Expressão; Do Direito ao Desporto e ao Lazer; Do Direito ao Território e à Mobilidade; Do Direito à Sustentabilidade e ao Meio Ambiente e Do Direito à Segurança Pública e ao Acesso à Justiça. Diante do crescimento da política neoliberal no Brasil, caracterizado pela diminuição da participação do Estado na economia e na sociedade, se verifica a efetivação de privatizações, das concessões e principalmente, o descompromisso com as políticas sociais, com a ideia do Estado Mínimo.
Neste contexto pergunta-se como garantir os direitos previstos no Estatuto da Juventude? Como o Estado pode ofertar o direito à profissionalização, ao Trabalho e a Renda para milhões de jovens brasileiros? Como a crise financeira atinge os jovens? Como as atuais condições de trabalho afetam os jovens? Como eles podem conciliar trabalho e estudo? Para compreender este fenômeno primeiramente é necessário ter claro o conceito de juventude, o Estatuto da Juventude no Art.1 Inciso II traz “são consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos de idade”, mas a faixa etária é apenas uma das características da juventude.
Portanto, a terminologia ‘juventudes” representa as diferentes maneiras de ser abordado o tema, sendo que para é um período do ciclo da vida, que atravessa a infância para a vida adulta e produzem significativas transformações biológicas, psicológicas, sociais e culturais, que podem variar de acordo com as sociedades, as culturas, as classes, o gênero, a inscrição étnico-racial e a época” .
As relações de trabalho no mundo e no Brasil não garantem condições dignas de trabalho aos jovens, pois participam do mercado de trabalho com vínculos trabalhistas precários, como por exemplo: as terceirizações, os estágios remunerados, o emprego informal, os baixos salários, que impossibilitam na sua maioria a profissionalização e escolarização, já que não é possível a conciliação do trabalho e do estudo.
As recentes reformas trabalhistas ocorridas no país e a visão neoliberal consolidam as precárias relações de trabalho, sendo que as propostas do governo federal atual, temos por exemplo o Programa “Carteira verde amarelo”, que tira os direitos trabalhistas, com o falso intuito de inserir o jovem no mercado de trabalho. Também é incentivado o ensino técnico ou cursos de qualificação como solução de empregabilidade e o incentivo ao empreendedorismo pelo jovem, na busca da sua autonomia financeira.
A questão central da relação entre juventudes e inserção do mundo do trabalho não ocorre somente em virtude da pouca ou baixa qualificação profissional, mas pelos precarizados e flexíveis postos existentes no mercado de trabalho, na perspectiva da ampliação do acúmulo de capital, com base na máxima exploração da mão-de-obra. O ingresso dos jovens no mercado de trabalho para atuarem como força produtiva na sociedade e alcançar a sua almejada autonomia, não se concretiza na totalidade para todos os jovens.
Tal fenômeno ocorre devido a diversos fatores, como por exemplo: o baixo crescimento econômico, necessidades de trabalhadores com maior experiência, falta de qualificação e escolarização adequada, o número expressivo de jovens no momento histórico, o alto nível de pobreza na atualidade levando os jovens a abandonar a escola e ingressarem no mercado informal ou no mercado de trabalho que exige baixa escolaridade, a dificuldade de conciliar a escola com o trabalho e principalmente a ausência de políticas públicas que ofereça resposta a esta demanda da sociedade.
A construção destas políticas sociais deve considerar as múltiplas facetas da juventude brasileira e garantir a proteção integral aos jovens quanto a educação, saúde, trabalho, profissionalização, renda, cultura, desporto, lazer, mobilidade, ao meio ambiente, segurança pública e acesso à justiça com uma atuação intersetorial e de forma articulada para torna-se efetiva.
Texto Referencia
O TRABALHO E A “JUVENTUDES” PROTEÇÃO OU (DES)PROTEÇÃO SOCIAL de Mônica Ogliari Pereira.docx